UM MUSEU PRA VALENÇA ANTES QUE NOSSA HISTÓRIA SEJA SEPULTADA
Por Adriano Pereira de Queiroz, João Barreto Júnior, Jonas Grisente dos Reis da Costa e Juscimare Souza.
Recuperar e reimaginar é o tema escolhido esse ano para o Dia Internacional dos Museus, comemorado na data de hoje. Apesar da sua importância e condição histórica, a cidade de Valença ressente-se em não possuir um espaço adequado para abrigar nossa memória coletiva, nem para seus filhos e filhas, futuras gerações ou mesmo pra quem a visita.
Já se tornou lugar comum repetir o velho jargão da professora Emilia Viotti que “Um povo sem memória é um povo sem história. E um povo sem história está fadado a cometer, no presente e no futuro, os mesmos erros do passado”.
Não fossem os esforços e algumas iniciativas como o Memorial da Câmara de Vereadores, que se encontra fechado e do Museu Afro Bantu Indígena da Costa do Dendê, situado na Comunidade Caxuté, zona rural de Cajaíba, que reclamam urgente um maior investimento e reconhecimento, nossas histórias e memórias continuam sendo desprezadas e jogadas, literalmente, no lixo.
Até quando? E por que? A quem interessa? Quando gestores, vereadores, políticos, homens do poder e do dinheiro perceberão e reconhecerão que investir na recuperação e valorização disto pode, inclusive, gerar renda pra eles também e tornar seus nomes melhor vistos pelas populações em geral? É vergonhoso ver uma elite que vangloria-se em querer viajar e gastar “mundos e fundos” para ver as belezas do “velho mundo”, mas não investe um centavo para recuperar e valorizar sua própria história. Talvez, porque, envergonhe-se do nosso passado escravocrata, do nosso pé na senzala, do extermínio das populações indígenas que até hoje subsistem…
Pedimos desculpas pelo tom indignado. Mas não podemos nos expressar de maneira diferente. Ou nos reconciliamos já com nossa história ou continuaremos queimando, massacrando e matando índios, negros e negras; perdendo nossa humanidade…
Sabemos que esta não é uma realidade apenas em Valença. Mas, seguindo a máxima do grande escritor Leon Tolstói, quando afirmou “Canta a tua aldeia e serás universal”, queremos localizar nossa fala em Valença e nossa realidade, ainda que isso possa desagradar os mais próximos, que esperamos, não levem pro aspecto pessoal, vez que há anos, batemos nessa tecla. Talvez, de tanto batê-la, alguns já não a escutam ou fazem “ouvidos de mercador”… Mas, inspirados em Bethoven, que ignorando a surdez, criou novos mecanismos para continuar compondo, ousamos “quebrar algumas teclas”, vez que, abusando de mais uma citação, tão cara aos que gostam delas, “se nos calarmos, até as pedras falarão”…
Pra finalizar, há em Valença diversos espaços além dos citados, que poderiam abrigar um museu. Queremos destacar a nossa “cadeia pública”… Para ser mais exato, a “Casa de Câmara e Cadeia” que agoniza a céu aberto assustando quem passa pela sua rua…
Há exatamente um ano atrás, em meio à pandemia, lançamos nas redes virtuais uma “carta aberta”, assinada por mais de 50 personalidades e representantes de entidades, pedindo providências em relação à este prédio que é, talvez, a nossa “certidão de nascimento” enquanto cidade… além das plantas que precisam ser retiradas e uma limpeza na fachada, técnicos que fizeram a vistoria na época, afirmaram que o essencial, pra que o prédio não seja mais danificado é a troca do telhado… uma licitação chegou a ser lançada ano passado, mas não avançou…
Repetimos aqui o último parágrafo da “carta”, na esperança de que o “novo governo” ouça esse brado, antes que seja tarde: Se o poder público não tem recursos no momento, desenvolva uma parceria público-privada. Ceda, inclusive, parte dele com um contrato de comodato. O que não faltará são empresários interessados numa área tão nobre. Inaceitável é deixá-lo na situação em que se encontra, podendo ruir a qualquer momento, sem nenhuma manutenção e colocando em risco a vida de centenas de pessoas que diariamente trafegam naquela rua.
Imagem: Ney Doyle / Jornal Valença Agora
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Sobre os autores:
Adriano Pereira de Queiroz, Conselheiro Estadual de Cultura, escritor e produtor cultural, estudou História no Centro De Artes e Humanidades da UFRB, em Cachoeira e atualmente cursa Direito no Campus XV da UNEB Valença, onde reside.
João Barreto Júnior, suplente no Conselho Municipal de Políticas Culturais em Valença, representa a cadeira de História e Memória. É jornalista, pós graduando em cidades inteligentes.
Jonas Grisente dos Reis da Costa, Conselheiro Municipal de Políticas Culturais em Valença, representante da área de Patrimônio. Arquiteto e Urbanista, Perito Judicial com Ênfase em Avaliação de Imóveis e Engenheiro de Segurança do Trabalho.
Juscimare Souza – Ex presidente do Conselho Municipal de Políticas Culturais em Valença, Secretária Executiva do Instituto Cultural Euzedir e Araken Vaz Galvão.
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Nesta coluna “Não é Bem Assim”, o leitor do Baixo Sul em Pauta encontra confrontos de ideias, debates, discussões, polêmicas e reflexões sobre temas importantes que estão em pauta. São vários pontos de vista para você formar a sua opinião. Personalidades de nossa região tem espaço para publicar artigos de sua autoria, com argumentos e posicionamentos que podem ajudar a compreender melhor alguns assuntos.
O que você vai ver por aqui: Vamos virar do avesso várias matérias que vemos publicadas por aí para que você possa se aprofundar na informação e saber que, por trás de algumas notícias, sempre podemos ver que “Não é bem assim”…